Marcos Vianna

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Cloro na água de beber faz mal?

 

Será mesmo?

 

E agora? Dizem que beber água clorada pode dar câncer, que tomar banho com água clorada estraga a pele e os cabelos, que a água clorada cheira mal, que dá dermatite, asma... será verdade? Neste artigo, vamos nos concentrar na água de beber. Na piscina, a conversa é outra. Depois eu conto.

 

Beber água faz mal à saúde?(*)

 

Não existe vida sem água. Pelo menos, no que diz respeito às formas de vida que conhecemos.

 

Mas seu consumo excessivo pode ser maléfico à saúde.

 

Água clorada

 

Por exemplo: nossos rins podem filtrar até cerca de 800 a 1000 mililitros de água por hora.

 

Mais do que isto... bem, a água em excesso vai parar em nossas células.

 

Nosso organismo vive num delicado equilíbrio osmótico, envolvendo tipicamente uma solução de sódio em água. A parede celular é a membrana osmótica, sedo responsável por manter o equilíbrio necessário.

 

Água clorada

 

Se bebermos água em excesso, a solução que circunda a célula ficará diluída. Neste caso, a água atravessará a parede celular e entrará na célula para manter o equilíbrio osmótico. Ocorrerá o que os médicos chamam de intoxicação por água. Pode ser fatal!

 

Mas no cérebro a história é diferente A caixa craniana não permite o aumento do volume. Então, quando as células do cérebro absorvem água e aumentam de volume, a pressão na cabeça aumenta. Aí, primeiro vêm as dores de cabeça, confusão, sonolência... podendo chegar ao coma e à morte!

 

Mas a boa notícia é que, como tudo na vida, nada disso acontecerá se você não exagerar. Um adulto saudável necessita de algo entre 3 e 4 litros de água por dia. Mas esse volume inclui a que vem com os alimentos e outras bebidas. Quer dizer: beba água quando estiver com sede e pronto.

 

Por que a água potável é clorada?

 

O cloro é um desinfetante químico, sendo capaz de matar muitos organismos patogênicos.

 

Água clorada

 

Mas ele pode não ser suficiente em certos casos. Por exemplo: a turbidez da água é capaz de proteger esses organismos da ação do cloro. Biofilmes desenvolvidos em sistemas de distribuição também são capazes de oferecer essa proteção. Além disto, existem microrganismos que podem resistir à sua ação.

 

Por estes motivos, para que a água se torne potável, não basta clorá-la. É necessário que ela atenda a vários requisitos estabelecidos pelo padrão de potabilidade. No Brasil, ele é estabelecido pelo Ministério da Saúde (**).

 

Mas o cloro apresenta uma vantagem inquestionável sobre diversos outros agentes desinfetantes: trata-se de seu efeito residual. Isto é: ele permanece na água tratada. Assim sendo, eventuais contaminações que venham a ocorrer na rede de distribuição poderão ser descontaminadas pelo cloro residual presente na água.

 

E a análise do cloro residual é fácil de ser feita. Existem equipamentos portáteis para esse fim, como, por exemplo, os do tipo que utilizamos em piscinas. É só coletar a amostra, pingar umas gotas de um reagente e comparar a cor resultante com as que aparecem no próprio equipamento.

 

Água clorada

 

A gente sabe na hora qual é a concentração do cloro residual existente.

 

Em seu Artigo 16, alínea 6, o padrão de potabilidade brasileiro recomenda manter [na água tratada] o teor mínimo de cloro residual livre de 0,5 mg/L.

 

E aquele cheiro, aquele gosto de cloro?

 

É preciso “errar a mão” na dosagem de cloro para que isso aconteça. A concentração mínima de cloro para que se perceba sua presença em água destilada através do gosto é 5 miligramas por litro, ou seja, dez vezes acima do teor recomendado acima. Para se perceber essa presença através do odor é 2 miligramas por litro.

 

Então, se a água está com cheiro ou gosto de cloro, provavelmente essas características resultam da presença de algum composto de cloro que se formou porque a água trazia consigo algum componente que deveria ter sido removido na estação de tratamento de água. Desconfie da água então. Reclame do seu fornecedor. Mas fique sabendo que, embora o cheiro não seja do cloro na forma em que deveria estar presente na água, foi a presença do cloro que ligou o sinal de alerta!

 

E aquela água branca que sai da torneira, de tanto cloro?

 

Água clorada

 

O cloro adicionado à água nas concentrações recomendadas faz com que ela permaneça incolor.

 

De modo geral, a água fica esbranquiçada quando a pressão cresce havendo ar presente.

 

Quanto maior a pressão, mais ar a água consegue dissolver. Aí, quando a torneira é aberta, a pressão diminui, e o ar em excesso não consegue mais ficar dissolvido. Aí ele forma microbolhas de ar no interior da água. Elas saem como o tempo e a água volta a ficar incolor.

 

É parecido com o que acontece quando a gente abre uma garrafa de refrigerante. O gás carbônico dissolvido no líquido permanece assim enquanto a garrafa está fechada, porque ele está pressurizado. Quando abrimos a garrafa, o gás em excesso sai e forma as bolhas. Só que elas são maiores.

 

É como afirma o pessoal do SAAE de Garça, São Paulo(***):

 

Essa água branca pode ser consumida sem nenhum problema.

 

Afinal, trata-se apenas de microbolhas de ar, e não de cloro ou qualquer outra substância que, se consumida em excesso, pode fazer mal. Mas se ainda assim, não se sentir à vontade, encha um copo com a água branca e deixe ele parado. Após alguns minutos, você irá perceber que a água ficará transparente. Isso acontece porque o ar será liberado no ambiente, de modo que o líquido voltará a ser incolor.

 

E os trihalometanos?

 

O cloro poderá reagir com moléculas orgânicas presentes na água e formar, entre outros compostos, os denominados trihalometanos e ácidos haloacéticos. Eles são compostos supostamente carcinogênicos.

 

Mas aí a culpa não é do cloro, e sim da presença dos precursores desses compostos. Eles são encontrados em águas brutas originárias de locais em que a água tenha se acumulado, permitindo o acúmulo de espécies vegetais em decomposição (substâncias húmicas).

 

É preciso manter as concentrações desses precursores sob controle na água a ser clorada, utilizando processos adequados nas estações de tratamento de água.

 

Uma vez presentes na água que chega à estação de tratamento de água, a remoção de compostos orgânicos desse tipo é possível através do uso de carvão ativado.

 

A Organização Mundial da Saúde cita que a maneira mais adequada de controlar a presença dos trihalometanos, ácidos haloacéticos e outros organoclorados é atuar sobre a presença de seus precursores no manancial de abastecimento. Esse mesmo órgão cita que a eficiência da cloração não deve ser comprometida pelas tentativas de se reduzir a concentração dessas substâncias na água tratada.

 

Em resumo:

 

Beber água demais faz mal à saúde.

 

Água clorada

 

Excesso de cloro na água de beber faz mal à saúde, mas ela tem que ter muito, mas muito cloro mesmo!

 

A Organização Mundial da Saúde(****) relata que, em seres humanos e animais expostos ao cloro presente na água potável, não foram observados efeitos adversos à saúde.

 

A Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) concluiu que os hipocloritos não são classificáveis como carcinogênicos para os seres humanos.

 

O valor de referência estabelecido para a concentração limite do cloro livre na água é 5 miligramas por litro. Mas trata-se de um valor conservativo, pois nenhum efeito adverso foi observado em seres humanos nas concentrações estudadas pela OMS.

 

Referências

 

(*) este texto foi adaptado da publicação: https://www.businessinsider.com/what-happens-when-you-drink-too-much-water-intoxication-2018-11. Acessada em 10/01/2024.

 

(**) Ministério da Saúde. Portaria GM/MS Nº 888, de 4 de maio de 2021.

 

(***) este texto foi adaptado da publicação: https://www.saaegarca.sp.gov.br/portal/noticias/ 0/3/703/ agua-branca-saindo-da-torneira-descubra-por-que-isso-acontece#:~:text=O%20 cloro%20que%20%C3%A9%20 adicionado, ele%20deixe%20a%20%C3%A1gua%20branca.

 

(****) WHO. Chlorine in Drinking-water Background document for development of WHO Guidelines for Drinking-water Quality. Geneva: World Health Organization, 2003